SUSTENTABILIDADE

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Especialista destaca a importância dos acordos ambientais internacionais

Sustentabilidade e consciência ecológica são dois termos que estão em voga em diferentes setores e, no âmbito internacional, não é diferente. No caso da União Europeia, percebe-se uma tendência em entendê-la como essencial para compreender o próprio desenrolar da relação entre comércio e meio ambiente nos próximos anos.

Em entrevista ao FGV Notícias, Rodrigo Fagundes Cezar, coordenador do grupo de pesquisa “Comércio e Desenvolvimento Sustentável”, certificado pela FGV e sediado na Escola de Relações Internacionais (FGV RI) com pesquisadores do Reino Unido, Australia e Suíça, salienta a relevância dos acordos ambientais internacionais, da diferenciação das políticas da União Europeia em relação a rigorosidade e de que forma os acordos comerciais podem se beneficiar dessas práticas. “A demanda por padrões de sustentabilidade amplos e rigorosos nos acordos de comércio da UE reflete uma série de interesses da sociedade civil e de grupos econômicos, e que vêm ficando cada vez mais fortes nos últimos anos”, ressaltou.

Qual a importância de compromissos ambientais em acordos de comércio?

Acordos internacionais em prol do desenvolvimento sustentável são muitas vezes ancorados em instrumentos de promoção. Em outras palavras, eles incentivam certas ações e processos, ou geram um guia de melhores práticas a serem implementadas pelos países. Esses compromissos muitas vezes não são obrigatórios. E mesmo os compromissos que são considerados obrigatórios sofrem por não terem instrumentos críveis de monitoramento e de resposta caso os países que deles fazem parte não os cumpram.

Por sua vez, acordos de comércio possuem instrumentos cada vez mais rigorosos de defesa do meio ambiente e dos direitos do trabalhador, por exemplo. Esses acordos também estão desenvolvendo mecanismos mais críveis de incentivo ao cumprimento de suas provisões e de punição no caso de descumprimento. De um lado, esse movimento pode gerar compromissos mais palpáveis em prol do desenvolvimento sustentável. De outro, eles podem trazer certos dilemas políticos que não são triviais.

O que há de novo e diferente na forma como a UE promove padrões ambientais em seus acordos comerciais?

A União Europeia tradicionalmente traz consigo a retórica de um bloco que promove o desenvolvimento sustentável por intermédio do comércio internacional. Até recentemente, no entanto, esses padrões ambientais nos acordos da UE eram quase que exclusivamente focados na cooperação técnica internacional, apesar de serem legalmente vinculantes. Em outras palavras, o cumprimento desses padrões é obrigatório, mas não havia, de fato, a possibilidade de impor punições contra os parceiros comerciais que não as respeitassem.

O que há de diferente e novo hoje é que os órgãos da UE têm interesse de aumentar o rigor dessas cláusulas, que poderão até mesmo levar a sanções comerciais no caso de descumprimento. Esse movimento por parte da UE, formalizado por meio de um documento datado de junho de 2022, não tem precedentes e terá importantes impactos sobre seus parceiros comerciais, incluindo Brasil e Mercosul.

Quem tem interesse em padrões ambientais ainda mais rígidos nos acordos comerciais da UE?

Primeiramente, ONGs, sindicatos e associações de defesa do consumidor se apoiam no argumento de que os padrões de sustentabilidade de acordos comerciais europeus ainda não surtem os efeitos desejados e que precisam então ficar ainda mais fortes. Esses grupos partem de experiências recentes para justificar essa posição, como o acordo entre UE e Coreia do Sul.

Segundo, com o movimento antiglobalização que se instaurou na Europa, o aumento do rigor de compromissos sustentáveis em acordos de comércio é uma das formas de apaziguar aqueles que são contrários à liberalização comercial. Para além disso, o temor de que o movimento antiglobalização possa levar a um entrave nas negociações comerciais da UE também ajuda a minimizar a oposição a compromissos de sustentabilidade mais fortes.

Terceiro, grupos produtivos europeus, como agricultores, estão cada vez mais sujeitos a regulações mais fortes por parte da União Europeia e querem que essas mesmas regulações ambientais mais rigorosas se apliquem a seus parceiros comerciais como uma forma de “nivelar o jogo”.

Há quem não queira que esses compromissos fiquem mais fortes? E por que é relevante entender esse processo político doméstico da UE?

Para muitas empresas, compromissos rigorosos de desenvolvimento sustentável podem gerar altos custos de ajuste. Isso não significa dizer que essas empresas não têm comprometimento algum com o desenvolvimento sustentável, apenas que elas preferem compromissos voluntários e flexíveis. Por exemplo, a BusinessEurope, uma organização que representa os interesses da indústria da União Europeia, consistentemente se posiciona contra compromissos de desenvolvimento sustentável em acordos comerciais que possam levar a sanções.

Como os compromissos mais fortes nos acordos comerciais da UE podem afetar o Brasil?

Com a divulgação de um documento por parte da Comissão Europeia em junho de 2022 indicando a possibilidade de mudança nos compromissos de desenvolvimento sustentável dos acordos comerciais da UE, o Parlamento Europeu pode exigir que o capítulo de comércio e desenvolvimento sustentável do acordo EU-Mercosul seja renegociado. De um lado, isso pode atrasar ainda mais o acordo como um todo. De outro, é possível e esperado que se gerem incentivos mais críveis para a ação do setor público brasileiro em prol de leis mais rígidas de proteção do meio ambiente, ainda que o conteúdo ou formato dessas iniciativas seja difícil de precisar neste momento. 

Quais as tendências para os compromissos de desenvolvimento sustentável em acordos comerciais?

Há três tendências claras em relação a compromissos de sustentabilidade em acordos de comércio: compromissos mais amplos, mais legalmente vinculantes e com mecanismos de monitoramento que podem levar a sanções comerciais. Em outras palavras, esses acordos tendem a fazer referência a um número cada vez maior de compromissos internacionais (por exemplo, convenções internacionais do clima). Eles tendem a usar uma linguagem cada vez mais rigorosa, exigindo, e não apenas incentivando, o cumprimento às provisões acordadas. Finalmente, um número cada vez maior de acordos condiciona a presença de preferências tarifárias (tarifas menores entre os países que são parte do acordo) ao respeito às provisões de desenvolvimento sustentável.

Fonte: Fundação Getulio Vargas