Os manguezais são zonas úmidas costeiras, localizadas entre os ambientes terrestre e aquático, e correspondem a cerca de 0,7% de todas as florestas tropicais. São ambientes especiais, pela sua limitação geográfica, pelos serviços ecossistêmicos que prestam e por garantir a sobrevivência humana das populações locais. Várias populações tradicionais vivem na região do estuário do rio Paraguaçu, onde se encontra a baía do Iguape, na Bahia, que já foi a “estrada” mais curta para todo o sertão. Os produtos do manguezal – caranguejos, siris e outros mariscos – foram sempre o alimento dos índios, escravos e serviçais. Atualmente, a região se encontra pressionada em seus extremos por dois grandes empreendimentos, geradores de fortes impactos no estuário.
Com a construção da barragem de Pedra do Cavalo (1985), e depois quando do início das operações da usina hidrelétrica da Votorantim (2005), houve uma fragmentação do estuário, como consequência do represamento da água. A construção dos empreendimentos trouxe alterações traumáticas para o estuário, bem como para a baía de Todos-os-Santos (BTS): redução na entrada de água doce, nutrientes, sedimentos e energia; além das alterações no regime de cheias, pois a barragem drena mais água entre junho e outubro, diferente do que estava acostumada. Também ocorrem períodos em que não há vazão do rio pela barragem, devido a uma “falha no projeto”, que impede menores vazões de serem liberadas, fora situações anômalas de maior vazão para cumprir protocolos legais, trazendo “muita água doce para o estuário”.
A criação da unidade de conservação Reserva Extrativista Marinha Baía do Iguape (Resex), no ano 2000, teve como objetivo salvaguardar o estuário do Paraguaçu. A mesma, pode parecer, em um primeiro momento, como uma conquista social, mas não houve, diferentemente de outras Resex, uma forte participação social para a sua criação, apesar da mobilização de moradores, sindicalistas e pescadores. Após mais de 20 anos de sua criação, a Resex não consegue alcançar seus objetivos de criação. As mais de 5.000 famílias de comunidades tradicionais abrigadas não compreendem ainda a extensão de seus direitos. Há que se entender que o manguezal depende da quantidade, da qualidade e do regime das águas que recebe do rio, tudo que foi alterado no caso do rio Paraguaçu, o que impõe um custo a ser pago pelas comunidades tradicionais. Assim, quando as comunidades falam na salinização, redução da pesca e da mariscagem, elas estão falando sobre o resultado das alterações presentes no estuário.
Manguezais: são zonas úmidas costeiras, localizadas entre os ambientes terrestre e aquático e correspondem a cerca de 0,7% de todas as florestas tropicais. Apresentam baixa diversidade de espécies arbóreas, diferentemente dos demais ecossistemas florestais.
Esses ecossistemas existem predominantemente em ambientes estuarinos, que representam o encontro da água doce com o mar.
Os manguezais ocupam uma estreita faixa influenciada pelos movimentos das marés, com variação de salinidade, sedimentos anóxicos e lodosos, ricos em matéria orgânica.
As árvores do mangue, cerca de dez espécies nos manguezais ocidentais do planeta, apresentam adaptações para viver nesses ambientes, com especializações morfológicas e fisiológicas.
No Brasil, os manguezais se distribuem ao longo da costa, desde o estado do Amapá, onde são mais frondosos, até o município de Laguna, em Santa Catarina, onde apresentam, frequentemente, uma menor estatura.
Segundo o Atlas de Manguezais do Brasil (MMA/ICMBio), temos cerca de 1.400.000 hectares de manguezais, sendo que nos estados do Maranhão, Pará e Amapá concentram-se 80% dos manguezais do Brasil.
Estas diferenciadas florestas de mangue que representam a base da cadeia alimentar do ecossistema manguezal sempre prestaram importantes benefícios às populações humanas, sejam eles diretos ou indiretos. Exemplo: pesca
Os manguezais também são responsáveis por manter o funcionamento de outros serviços que afetam o bem-estar das populações humanas em longo prazo, como a ciclagem de nutrientes e produtividade primária, necessária para a vida de diversos organismos.
Existem ainda os benefícios culturais criados pelas comunidades tradicionais, a partir da prática pesqueira integrada aos manguezais.
Os manguezais também contribuem para a regulação do clima, através do armazenamento de carbono, podendo sim, sua conservação ser aliada contra as mudanças climáticas globais de origem humana.
Acrescenta-se ainda, seu papel no controle de inundações e erosões, na transferência de recursos para a região costeira, manutenção da biodiversidade e, principalmente, na sustentação das comunidades tradicionais por séculos.
Devemos olhar que esses tais benefícios não estão apenas no presente, e sim já por muitos séculos fazem parte da vida dessas populações tradicionais.
Em termos sociais, há uma contradição ecológica entre a construção da barragem e a geração de energia hidrelétrica e o manguezal, com um prejuízo enorme para o estuário, o manguezal, a baía de Todos-os-Santos (BTS) e, por conseguinte, para as pessoas que dependem desses recursos, no caso, sempre os mais pobres. Para piorar ainda mais a situação, houve a construção do estaleiro Enseada do Paraguaçu (2012), que reduziu, com a participação do Governo Federal, a área da Resex para dar lugar a um empreendimento com forte subsídio e alto impacto para a área.
A baía do Iguape apresenta grande importância ambiental e socioeconômica para as comunidades tradicionais que ali vivem, incluindo remanescentes de quilombo. Mas a força do capital, aliada à uma política que rejeita os direitos dos indivíduos, por parte do Estado, impõe um sistema que se antagoniza às prioridades das comunidades tradicionais. O ônus dos empreendimentos fica nas costas dos pescadores, marisqueiras e das comunidades tradicionais, enquanto o lucro vai para os donos do capital, com a benevolência do Estado em todas as situações.